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Inteligência Geográfica: de John Snow a Yves Lacoste

  • Foto do escritor: Oliveira
    Oliveira
  • 5 de jul. de 2021
  • 4 min de leitura

Atualizado: 19 de abr. de 2023

Com certeza você já ouviu falar no John Snow e Yves Lacoste, mas será que você sabe o que ambos tem a ver com Inteligência Geográfica?


Fonte: Kolios et al., (2017)

Durante crises, sejam elas devido a conflitos armados ou em decorrência do surgimento de doenças, conhecer o ambiente sempre foi algo de suma importância. Esse conhecimento das características do meio pode ser obtido tanto de forma qualitativa quanto quantitativa. Seja por meio informações estatísticas como tamanho de população, renda e outras informações demográficas do território, quanto por meio do mapeamento das feições físicas (relevo, clima, vegetação, geologia etc). E foi justamente com a necessidade de se conhecer as características do ambiente que John Snow se tornaria o primeiro a utilizar-se de Inteligência Geográfica.


John Snow foi o médico inglês responsável pela descoberta de que a cólera era causada pelo consumo de água contaminada por fezes, em 1854. Com a epidemia de cólera que assolava o distrito de Soho, em Londres, Snow teve a brilhante ideia de mapear todos os poços de água do distrito. Após associar a localização dos poços, com a ocorrência dos casos de cólera, ele foi capaz de descobrir qual era a fonte da epidemia, percebendo que havia uma forte relação dos casos com o poço de Broad Street. A partir da descoberta, Snow recomendou que o poço fosse fechado para evitar a contaminação de novas pessoas.


Fonte: adaptado de E. Tufte, 1983

O sucesso do caso de Snow ajudou não só a mitigar a epidemia, como também foi um dos primeiros exemplos de utilização de análise de dados espaciais. Foi justamente a correlação entre os casos de cólera e a “geolocalização” dos poços que proporcionou a Snow a capacidade de identificar o epicentro do problema e posteriormente planejar o que seria feito, demonstrando de forma prática a importância de se conhecer o fenômeno estudado e de se possuir dados espaciais confiáveis para auxiliar na tomada de decisão.


Snow utilizou o que havia em sua época para resolver o seu problema, mas e os nossos problemas atuais? Como poderiam ser amenizados? O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é um dos órgãos de Estado mais importantes, ele é responsável pelo levantamento de informações a respeito de nossa população. Dados como renda, idade, escolaridade e sexo são apenas algumas das diversas informações que o senso levanta. Esse estudo é responsável pelo raio-x do Brasil e gera dados que podem auxiliar no planejamento do território, proporcionando que os gestores se distanciem do “achismo” e trabalhem com dados REAIS. É nesse ponto que contextualizamos a importância da Inteligência Geográfica com a Pandemia do novo Corona Vírus (Sars-CoV-2), causador da COVID-19.


Fonte: Close

O Brasil é um país composto por 26 estados, um Distrito Federal e 5570 municípios, com diversidade climática, social e demográfica. Por ser um país de proporções continentais, seu planejamento também deveria seguir a magnitude de seu território. Planejar a contenção de uma pandemia nunca foi, não é, e dificilmente será uma tarefa simples. Porém pode ser facilitada pela utilização dos dados existentes e de profissionais aptos a catalogar, organizar e analisar de forma espacial as informações geradas.



A utilização de dados sobre idade da população e renda já seriam capazes de apontar os municípios que deveriam receber maior atenção, mesmo com a pouca informação, na fase inicial, sobre a COVID-19, ficou evidenciado devido as internações e a carência de acesso ao sistema de saúde que os idosos e as populações de baixa renda seriam as mais afetadas pela doença. Informações ainda sobre fluxo entre centros urbanos e municípios vizinhos auxiliariam a determinar quais áreas deveriam reduzir o fluxo social, visto que no Brasil, com exceção de Araraquara-SP, nunca foi decretado um Lockdown. Nesse momento, você caro leitor, deve estar se questionando: mas caro escritor, você acredita que isso seria uma tarefa simples? E eu respondo de forma convicta: claro que não, mas seria uma tarefa possível e necessária a ser realizada, assim como foi difícil e necessário mapear os territórios no período das grandes guerras.


E foi justamente durante as grandes guerras pelas quais a humanidade passou, que se mostrou vital conhecer o espaço geográfico, mapeando o terreno para melhor conhecer cada parte do território. Seja para alocação de bases militares ou até mesmo para planejar invasões a territórios inimigos. Isso explica e muito a importância de áreas como o Estreito de Dover, Pearl Harbor, Canal de Suez e o Canal da Mancha nos períodos de Guerra.


Yves Lacoste, Geógrafo Francês, abordou em sua obra “A geografia serve em primeiro lugar para fazer a guerra” o quanto conhecer o território é vital, ao escrever que [...] “Não se trata unicamente de deslocar tropas e seus armamentos uma vez já desencadeada a guerra: trata-se também de prepará-la, tanto nas fronteiras como no interior, de escolher a localização das praças fortes e de construir várias linhas de defesa, de organizar as vias de circulação” (Lacoste, 1988, p.13).


Em sua obra Yves Lacoste trata muito além da necessidade de se conhecer o território, ele aborda a importância da Geografia enquanto ciência, mas fica evidente a importância que as informações sobre o espaço geográfico têm para o planejamento estratégico. Nesse contexto as atuais crises socioambientais e de segurança pública, devido aos seus desdobramentos, tem evidenciado a necessidade de que os gestores utilizem mais informações geoespaciais, não de forma isolada, mas por meio de analises espaciais mais complexas, assim como fez Snow, com a finalidade de mitigar as crises.



Foto: Jefferson Peixoto - Secom

Mapear os aspectos físicos do território em escalas maiores, com maior nível de detalhe, nunca foi tão importante. Informações como relevo, vegetação, áreas impermeabilizadas, áreas construídas e dados sobre corpos hídricos podem servir como subsídio para um planejamento territorial mais eficaz e que atenda ao Estado e a população, seja com vistas para evitar ocupações de áreas sensíveis ou até mesmo auxiliar forças de segurança em ações emergenciais.





Kolios S., Vorobev A., Vorobeva G., Stylios C.GIS and Environmental Monitoring: Application in the Marine Atmospheric and Geomagnetic Fields, Springer (2017)

ISBN 978-3-319-53084-0.


Tufte, E.R. The Visual Display of Quantitive Information. Cheshire, USA, Graphics Press, 1983.

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